Na internet, parece que todo mundo deveria fazer uma “detox” de tempos em tempos.
Mas o que quase ninguém fala é que existem situações em que iniciar um protocolo detox, mesmo que natural, pode ser não só inútil, mas perigoso.
Neste artigo, você vai entender em quais casos uma “cura detox” não deve ser feita, por que, e o que a ciência diz sobre os riscos em situações específicas.
1. Em caso de transtornos alimentares (diagnosticados ou suspeitos)
Dietas “detox” são frequentemente usadas como formas disfarçadas de restrição alimentar extrema.
Para pessoas com histórico de:
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anorexia nervosa
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bulimia
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transtorno da compulsão alimentar periódica (TCAP)
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ortorexia
… essas práticas podem reativar comportamentos de risco, como jejum compulsivo, culpa alimentar, compensações purgativas e obsessão por pureza.
Estudos clínicos apontam que regimes detox têm grande adesão em populações com distorção da imagem corporal e relação disfuncional com a comida.
2. Durante gravidez ou lactação
Nenhum protocolo detox deve ser feito durante a gestação ou amamentação sem orientação médica formal.
Motivos:
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O corpo já passa por intensas adaptações hormonais e metabólicas.
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Jejuns ou restrições podem reduzir o aporte de nutrientes essenciais ao feto/bebê.
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Certas plantas usadas em chás “detox” (como sene, boldo, cavalinha) podem ter efeitos abortivos, laxantes ou diuréticos fortes.
Mesmo práticas leves, como “jejum intermitente”, não são indicadas sem acompanhamento nutricional e obstétrico.
3. Se você está em uso de medicamentos contínuos
Fitoterápicos comuns em detox (boldo, alcachofra, chá verde concentrado, carvão ativado) podem interferir na absorção e metabolismo de fármacos, como:
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Anticoncepcionais orais
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Antidepressivos
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Anticoagulantes
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Antiepilépticos
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Anti-hipertensivos
Além disso, práticas que envolvem diarreia ou desidratação (ex: uso de laxantes, clisteres ou jejuns secos) podem modificar os níveis plasmáticos dos medicamentos.
Mesmo uma infusão de plantas “naturais” pode ter interações graves, o “natural” não é sinônimo de inofensivo.
4. Se você tem doenças crônicas (diagnosticadas ou não)
Muitas pessoas iniciam uma detox como “última tentativa” de melhorar sintomas persistentes: fadiga, digestão ruim, dores, ganho de peso, etc.
Mas em casos de:
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diabetes
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doenças hepáticas ou renais
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hipotireoidismo
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doenças autoimunes
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síndromes intestinais crônicas
… o risco é grande de:
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descompensar o quadro
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perder massa magra
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induzir crises inflamatórias
Detox sem diagnóstico é perigoso: não trate sintomas inespecíficos com restrições não supervisionadas.
5. Se você já está fisicamente ou emocionalmente exausto
Fazer uma detox não é uma solução rápida para “recomeçar a semana” quando você está no limite.
Ao contrário: jejum, dieta líquida, restrições ou plantas diuréticas podem agravar ainda mais a fadiga, a irritabilidade e o estresse.
O corpo exausto precisa de:
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sono de qualidade
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refeições nutritivas e regulares
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hidratação
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redução de estímulos
Começar uma detox num estado de esgotamento piora o quadro ao invés de aliviar.
Conclusão
Detox não é neutro.
É uma prática que exige consciência, avaliação e, muitas vezes, acompanhamento profissional.
Se você se reconhece em uma ou mais dessas situações, o melhor caminho não é “limpar o corpo”, e sim investigar a causa real do desconforto.
Cuidar do corpo começa por respeitar seus limites, e não por forçá-lo a funcionar de outro jeito.
Referências científicas
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Bratman S, Knight D. Health food junkies: orthorexia nervosa. Broadway Books. 2000.
(obra pioneira sobre ortorexia e comportamento alimentar disfuncional)
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Hay PJ et al. Treatment of patients with eating disorders in the community. Medical Journal of Australia. 2015. https://pmc.ncbi.nlm.nih.gov/articles/PMC9813802/
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Ernst E. Risks of herbal medicinal products. Public Health Nutrition. 2002. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/15386721/
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Posadzki P et al. Herbal medicines: interactions with prescribed drugs. Drugs. 2013. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/19719333/
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American College of Obstetricians and Gynecologists. Nutrition during pregnancy. ACOG Guidelines. 2020.
(Recomendações oficiais para restrições e suplementações em gestação)